“Nos chamamos Cosmopolis pois queremos ser um caldeirão de todos os tipos de tradições musicais”: 3 perguntas para Gavin Kendall, do Cosmopolis
Pegue três velhos amigos que adoram rock e música eletrônica, mas estão espalhados pela Europa, e os coloque para trabalhar juntos e criar uma banda. Essa é a fórmula que deu origem ao Cosmopolis, a banda europeia que fazia música à distância antes mesmo de fazer coisas à distância ter se tornado algo comum.
Conversamos com Gavin Kendall, vocalista do Cosmopolis, sobre The Distances, a última música lançada por eles, influências musicais e a relação da banda e você pode conferir essa conversa agora.
E, caso fique curioso para ouvir as bandas citadas por Gavin, você pode conferir a playlist de indicações feita por eles no fim da entrevista.
The Distances é uma música introspectiva e um pouco claustrofóbica. Como foi o processo de escrita? Como vocês estavam se sentindo enquanto escreviam?
Escrevemos ela ano passado, em uma das raras ocasiões nas quais estávamos todos juntos. Estávamos perto de Cherbourg, na França, em uma pequena casa na praia que um amigo emprestou para nós e foi um momento maravilhoso. Era um pouco isolada, então poderíamos fazer muito barulho sem nos preocuparmos com os vizinhos.
Nós escrevemos a música quando estávamos muito felizes e otimistas. Queríamos um sentimento dark no instrumental, mas com um final que fosse menos contido e que tivesse o sentimento de libertação, mas ainda desse uma sensação de ansiedade. Liricamente, tínhamos a ideia de que deveria ser algo sobre exclusão, isolamento e destruição — tanto política quanto ambiental.
Ultimamente, nós tivemos que nos acostumar com a ideia de fazer tudo à distância. Por outro lado, vocês fazem isso há algum tempo, já que cada um vive em um país diferente. Como isso influencia as composições e o relacionamento da banda?
Nós somos velhos amigos que viviam na mesma cidade. Isso é importante pois significa que confiamos uns nos outros no processo de composição e confiança é muito importante.
Se você está fisicamente reunido quando está compondo, é muito mais fácil ter ideias e descartar aquelas que não estão indo a lugar algum, mas é mais difícil fazer isso na nossa situação, já que às vezes alguém tem que dizer ‘eu sei que você está trabalhando nessa melodia por duas semanas, mas não está funcionando’. Todos sabemos que a música precisa vir primeiro, então fazemos isso de uma maneira na qual ninguém fica chateado!
Estamos acordados e trabalhando em músicas em horários diferentes e essa é uma maneira muito produtiva de se trabalhar — sempre há algo novo para ouvir e ajustar. Como qualquer atividade, eu acho que ficamos melhores quanto mais fazemos algo.
Tem um lado ruim: é inegável que quando estamos todos juntos no mesmo lugar, acabamos tendo ideias que nunca teríamos sozinhos. Você reage às ideias dos outros e acaba compartilhando da mesma energia. É um processo onde você pode surgir com algo que é mais interessante do que quando várias coisas são colocadas juntas. Estamos ansiosos para estarmos todos no mesmo lugar novamente para que possamos trabalhar em algo novo.
Quais são suas principais influências musicais?
É muito difícil te falar sobre todas as nossas influências musicais, especialmente porque nós três ouvimos coisas diferentes ao longo dos anos e às vezes isso pode fazer uma diferença em nossa música sem que saibamos disso, mas alguns artistas vem à mente.
Primeiro de tudo, existe uma parte dos anos 60 e 70 que alguns podem chamar de art-rock. Os mais importantes para nós foram The Velvet Underground e David Bowie. Com eles, foi possível escrever sobre outros assuntos além de amor, mesmo que fossem assuntos desagradáveis. É claro que isso já era possível em outros gêneros musicais — é só ouvir Bob Dylan ou Nina Simone, por exemplo — mas pareceu um momento revolucionário no pop e no rock. Também começamos a ver experimentações interessantes nas estruturas das músicas e elas poderiam durar mais do que só três minutos!
Segundo, bandas pós punk, como The Fall, Talking Heads, Josef K, Magazine, The Buzzcocks, Gang of Four e Joy Division. Aqui, o que é importante é a ênfase em músicas acessíveis, mesmo que ainda estranhas. O que é ótimo sobre essas bandas é que elas eram secas e diretas, mas ainda mantinham a ideia de que o rock poderia ser artístico.
E existe a influência da dance music. Nós gostamos muito do tipo de música que combina o funk de James Brown e artistas como ele com a música eletrônica do Kraftwerk. Por exemplo, a música que veio de Detroit nos anos 80: Cabaret Voltaire, The Future Sound of London, Tackhead. E aí você tem o trip-hop do Portishead e Massive Attack, house music e a chamada Intelligent Dance Music de gente como Autechre ou Aphex Twin. O que tiramos disso é a importância de usar máquinas para criar o groove da música.
Para finalizar, tem o tipo de música que alguns chamam de bandas de ‘soundtrack’, onde todas elas provavelmente devem alguma coisa ao Brian Eno. Beaumont Hannant, Boards of Canada, Mogwai, Godspeed!, You Black Emperor são ótimas nisso e ainda existem os neo-clássicos como Olafur Arnalds e Nils Frahm. Gostamos da ideia de que nossa música (ou um pedaço dela) pode ter alguma qualidade cinematográfica, então tentamos incorporar um pouco disso nela.
Para resumir, somos fortemente influenciados pelo crossover de art rock e eletrônica. Recentemente, graças aos serviços de streaming, começamos a ouvir músicas de outras partes do mundo (crescendo, parecia que música estadunidense e do Reino Unido eram os limites do nosso horizonte).
Sempre foi incrível quando podíamos viajar (parecem séculos desde que isso aconteceu na última vez) e ouvíamos o Fado em Portugal, Said no Egito ou Tango na Argentina, por exemplo. Pessoas como David Byrne tem sido curadores importantes desse tipo de música para uma audiência que, como nós, está trancada em música anglicana. E nós nos chamamos Cosmopolis pois queremos ser algo como um caldeirão de todos os tipos de tradições musicais.
Confira a playlist "Indicações: Cosmopolis":